sábado, 14 de abril de 2012


Carta de despedida, 27 de janeiro de 2009. 
Queria começar escrevendo essa carta com a caligrafia mais esplêndida e maravilhosa que existe. Uma letra fininha, leve e arrebitada. Mas não é possível, já que eu sou canhota e mão pesada. Repleta de letras gordas e grandes. Então, não repare na minha forma de escrever, somente leia atenciosamente cada palavra, e não se esqueça das minhas mil e uma entrelinhas. Vi isso em filmes, e achei que poderia dar certo. Achei que quando você lesse esta carta, provavelmente amenizaria a dor ou por alguns segundos, fizesse você sorrir. É triste, não é? Eu era a brincalhona da turma, desde sempre. Os professores não gostavam muito das minhas piadas nas horas indevidas, ainda mais quando eram durante as provas. Eu costumava sentir prazer em fazer qualquer outra pessoa sorrir, porque é gostoso ver alguém feliz. Uma gargalhada, uma risadinha, sempre foi música para meus ouvidos. A sua então, era canto dos anjos. Daqui pra frente, talvez você ache que irá sorrir menos, mas não permito isso. Abra um sorriso e mostre-o, deixe que todos vejam esses seus dentinhos brancos feito gesso. Eu sinto muito se fiz algumas coisas que te machucaram, como da vez em que lhe fiz ciúmes com um velho amigo de infância. Desculpe também por ter me visto obrigada a ficar sem cabelos, já que você amava-os. Me desculpe se eu não fui uma boa companhia durante esse tempo em que você precisou acompanhar cada passo da doença. E me desculpe se no início desse ano, eu não lhe presenteei da maneira como você gostaria. Provavelmente quando você estiver lendo essas palavras, eu já não vou estar mais aqui. Então, peço que faça do meu funeral uma festa, e não uma despedida cheia de lágrimas e tristezas. Compre minha cerveja predileta e não deixe de fora a tequila. Por favor, ligue para aquela lanchonete e peça os salgados de lá, pois são os melhores. E espalhe por aí a frente, a minha felicidade. De verdade, eu não queria ir embora. Mas aprendi a lidar com a minha falta de escolha. Infelizmente, às vezes, temos de deixar para trás pessoas que nós amamos. E isso inclui você, meus pais e o Miau. Você sempre achou o nome “Miau”, a maior irônia. Já que ele é um cachorro, e não um gato. Cuide dele para mim, meu querido. Não deixe ele comer o assoalho e deixe-o longe da sua gaveta de cuecas, ele adora mastigar roupas íntimas. Arranje uma namorada para ele também, ele adora patinhos de pelúcia, mas dessa vez, compre em tamanho gigante, pois ele já cansou do pequeno. Sobre as minhas roupas, doe todas elas. Menos os sapatos, esses você pode dar à minha irmã, ela saberá o que fazer. Enquanto a você, peço que permita se apaixonar novamente. É sério! Abra seu coração, não se feche para o mundo só porque a sua ex, resolveu morrer. Mas por favor, nada de ficar com algumas daquelas suas amigas, elas não prestam. Arranje uma garota que te faça sorrir mais do que eu, alguma garota menos desleixada, e de preferência loura, pois sei que você sempre teve um abismo por elas. Arrume um amor que te liberte e não te sufoque, uma garota que não seja tão baixa e que tenha um sorriso quase tão belo quanto o seu. Arrume alguém que não se pareça comigo, e sim, que seja melhor. Pois quem sabe de alguma forma, ela chegará aos pés do tão grande homem que deixei para ela. E ah, caso você se apaixone mesmo, lembre a ela que em algum lugar, eu estarei vigiando-a. E caso ela parta seu coração, voltarei só para puxar seus pés. Enfim, meu herói.. Peço que se cuide, que não deixe nunca de escovar os dentes e que por favor, não se lamente todos os dias por eu estar morta. Deixo de herança para você, toda a minha felicidade, as minhas piadas de mau gosto, os meus brincos favoritos, minhas irônias e todo o meu ciúme. Em algum lugar do mundo, estarei cuidando para que você não seja infeliz e que não beba tanto. Lembre-se, amanhã de manhã eu ainda te amarei mais do que hoje. E não me esqueça. Não precisa aparecer no cemitério em todos os meus aniversários e nem precisa deixar flores sobre o túmulo. Eu não quero isso. Só lembre-se de quem eu fui em sua vida, das coisas que compartilhamos e dos truques sobre como as garota deixam os seios maiores. Use-os e abuse das memórias que te deixei, mas não se lamente. Pois não há nada que não foi dito ou feito. Acorde amanhã, ciente de que morri feliz, já que tinha você ao meu lado. E por fim, adeus, meu amor. 
P.s: Não deixe sua toalha molhada em cima da cama.”
Gabriela Machado.

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